8 de mai. de 2012

Educação e Tecnologia


Saíram dois ótimos textos sobre como o governo tem enxergado a questão da tecnologia nas salas de aulas das escolas públicas brasileiras. Há vários programas para aproximar a tecnologia de professores e alunos, mas nenhum programa sério para estabelecer uma relação de ensino/qualidade. Não há projetos sérios para melhorar a carreira de professor, tanto financeiramente como profissionalmente. Todos sabemos a importância primordial que professoras e professores tem nesse país, mas a realidade em que vivem atualmente, numa profissão extremamente desvalorizada, não reflete essa importância. Sem reconhecimento profissional, dificilmente se terá professores motivados. Portanto, apenas distribuir computadores e tablets não resolve nada.
Vale lembrar que muitas pessoas que estão nas salas de aulas lecionando não queriam estar ali. Os cursos de pedagogia tem inúmeros alunos que buscam apenas um diploma universitário, afinal existem inúmeros cursos de pedagogia e pouquíssimas escolas de aplicação. Os estágios são pouco supervisionados e muitos nem cumprem toda carga horária dos estágios em sala de aula. Há também os professores que estão e querem continuar lecionando na sala de aula, mas que além dos baixos salários enfrentam a violência e a falta de apoio do governo.
Programas como o ProUni promovem a formação de professores para as escolas públicas, mas não permitem que escolham outro curso que não seja pedagogia ou licenciaturas. Por outro lado, há várias pessoas que gostariam de estar lecionando nas salas de aulas, mas que no sistema atual não sentem que teriam êxito, porque não encontram liberdade e apoio para aplicar novas dinâmicas e não teriam reconhecimento profissional perante a sociedade. De nada adianta formar uma legião de professores se eles não querem realmente estar em sala de aula, se estão ali por falta de opções, porque não conseguiram passar em outros cursos e ter outras profissões.
Em As mentiras convencionais de nossa educação, Lincoll Secco enumera diversas mentiras dadas como soluções para a educação brasileira. Cita, inclusive, o arremedo de solução que o governo criou quando foi cobrado a abrir mais vagas nas creches e na educação infantil:
4. Não é verdade que a redução da idade de ingresso na escola atendeu critérios pedagógicos. Como as creches se tornaram um direito reivindicado pelas mães e custa mais barato abrir um turno na escola fundamental, os governos reduziram a demanda por creches fazendo as crianças saírem mais cedo delas.
5. Não é verdade que aumento salarial substancial não melhora a educação. O problema é que um professor carece de salário e status. A relação pedagógica é baseada principalmente na autoridade conferida ao docente pela avaliação, idade, conhecimento e respeito social. Como vivemos numa sociedade capitalista, é claro que a maior parte desses atributos depende da renda. Ou seja: do salário!
A demanda por berçários e creches no Brasil é tão alta que nem as instituições privadas dão conta, especialmente vagas no período integral. Há mães e pais que entram na fila da vaga antes do parto da criança. Uma das melhores soluções seria flexibilizar o horário de trabalho de mães e pais para que eles possam ficar mais próximos dos filhos nesses primeiros anos, mas sabemos que o capitalismo não está preocupado com isso. Se não há creches com quem mães e pais vão deixar as crianças? As empregadas domésticas cada vez buscam novas oportunidades no mercado de trabalho e babás especializadas fazem bem ao cobrar alto por seu trabalho. Atualmente, as famílias são pequenas e muitas vezes não há uma avó, madrinha ou outro parente para ficar com as crianças enquanto mães e pais trabalham. As pessoas terão que resolver essa questão, mas é preciso compreender que o bem estar das crianças é responsabilidade de toda a sociedade.
Em Ipad pra todo mundo, Ana Elisa Ribeiro fala justamente da simplicidade dos programas que apenas distribuem o instrumento tecnológico, mas não capacitam ninguém:
Tenho colegas que andam saltitantes de alegres com essa história de estados ou o governo dar iPads para os professores. Também dei lá meus pulinhos, mas não eram bem de alegria. É que fico perplexa com a superficialidade das soluções. Fico mesmo embasbacada e chego a perder parcelas de sono por conta disso. Será que é muito difícil de entender? Se alguém não tem condições dignas de trabalho (e de vida mesmo), não adianta dar um iPad, um refresco ou um jogo de resta um pro cara. O negócio é saber o que fazer com as máquinas. Mas deve ser bem difícil de compreender a profundidade desta condição.
Afinal, o que eu estou dizendo? Que os professores precisam mais de criatividade e do propiciamento de suas inteligências do que de máquinas novas. Sai até mais barato, quem sabe? Se bem que é claro que alguém fez essa conta antes de comprar os iPads. Provavelmente foi assim: se eu der esses brinquedinhos pra esse pessoal vai sair mais em conta do que qualificar todos eles e permitir que eles tenham ampliado seu letramento digital. A conta fecha.
É moleza fazer propaganda e dizer que está equipando as escolas com equipamentos da moda de última geração, mas o que isso realmente muda na vida de professores e alunos que convivem em salas super lotadas e com grandes barreiras comunicacionais? Fora a falta de autoridade, afinal o status dos professores socialmente é minúsculo.
Os jovens conhecem a tecnologia e mesmo para os mais pobres as lan houses foram uma importante porta de entrada, mas não há educação para cidadania por si só. É preciso aprender por meio das relações interpessoais, a criatividade pode ser estimulada de diferentes maneiras fora do meio digital e ela é fundamental para o aprendizado, pois é o contato com o concreto que facilita o caminho para o abstrato.
Li ontem que uma lei declarou Paulo Freire patrono da educação brasileira. Mais do que nunca é preciso retomar tudo o que Freire ensinou, que a tecnologia é importante, mas o fundamental é promover a educação por meio do cotidiano do aluno, deixando claro o quanto a política e os sistemas sociais influenciam na educação. Afinal, sempre há quem ganhe com a desvalorização da educação pública brasileira.

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